terça-feira, 16 de junho de 2015

CPqD terá de aceitar mudanças para não fechar as portas

A saída de Hélio Graciosa; a injeção de recursos pelo governo e a intempestiva nomeação do novo presidente, Sebastião Sahão Junior, não encerram a novela da crise política aberta entre o governo e a fundação, nem resolverão os problemas estruturais da entidade após seus 38 anos de existência. 
Documentos obtidos pelo portal Convergência Digital junto ao próprio CPqD, sob o compromisso de resguardar a fonte da informação, mostram que a fundação vive uma crise administrativa/financeira, que coloca em risco a sua sobrevivência como entidade promotora de Inovação no mercado de Telecomunicações.
Segundo os documentos, a crise do CPqD se aprofundou em 2014, mas em parte ela é decorrente de erros administrativos que vêm se arrastando ao longo dos anos. No ano passado, a empresa não cumpriu nenhum indicador financeiro relevante; tudo ficou abaixo das metas estabelecidas, num claro sinal de que as verbas do Funttel (Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações) poderiam amenizar a situação, mas dificilmente salvariam uma entidade.
O maior problema do CPqD estaria nas parcerias feitas com outras empresas do mercado de Telecom, as quais acabou se tornando sócia. Enquanto empresas como 'PadTeec'; 'Cleartech'; 'Civicom'; 'WXBR'; 'Trópico', 'JÁ' e sua subsidiária nos Estados Unidos ('CPqD EUA'), tinham como meta obter receitas num total de R$ 703 milhões, o resultado final ficou abaixo do esperado: R$ 640,5 milhões.
O EBTIDA destas mesmas empresas (lucro antes do pagamento de juros, impostos, depreciação e amortização), cuja meta para 2014 era de R$ 70,7 milhões, acabou ficando em apenas R$ 6 milhões. Muito abaixo das previsões otimistas dos executivos da fundação. Isso acabou se refletindo no EBTIDA da própria entidade, que tinha previsão bruta de obter lucro em torno de R$ 37 milhões e acabou registrando apenas R$ 24 milhões.
“(Hélio) Graciosa construiu uma base sólida para esta transição, que tem como foco a manutenção da essência e das diretrizes estratégicas que vêm orientando a atuação do CPqD ao longo de seus 38 anos de existência”, afirmou ontem em nota oficial o novo presidente do CPqD, Sebastião Sahão Junior, que até então respondia pela vice-presidência de Administração e Finanças da entidade.
Graciosa saiu atirando no governo alegando "atrasos" nos repasses do fundo para o CPqD. Praticamente creditou a crise financeira da fundação ao governo federal e a suposto interesse no aparelhamento político da entidade, que é privada há 38 anos. Diante de documentos sobre a situação administrativa-financeira do CPqD fica a pergunta: a crise foi realmente gestada por atuação do governo? 
Aparentemente o que ocorre com a fundação é que ela tomou a iniciativa e assumiu o risco de fazer investimentos com caixa próprio em determinados projetos, sendo que não tinha em seu orçamento essa disponibilidade em caixa. Somente o CPqD poderia explicar melhor essa situação. Mas fica a dúvida se a fundação não teria feito uma manobra contábil, retirando dinheiro compromissado com outras obrigações, para iniciar imediatamente determinado projeto, contando com a remota possibilidade do Funttel cobrir antecipadamente o rombo, passando por cima dos prazos naturais de empenho dos recursos, parte da burocracia que ocorre normalmente nas liberações de recursos orçamentários pelo governo.  
Outra tese também deixa margem para se pensar se a fundação tomou a iniciativa de bancar sozinha, com o seu orçamento, um determinado projeto e depois se viu com um rombo no caixa porque apostou na vinda de outras receitas, alheias ao Funttel, que não lograram êxito. O novo presidente está ciente e poderia esclarecer melhor o problema dos supostos "atrasos do Funttel", já que até recentemente respondia pelas finanças da fundação. Se confirmadas as denúncias acima ele continuará repetindo o mesmo erro agora como presidente? O futuro dirá.
Apesar de seu esforço de fazer parecer que houve uma transição natural dentro da fundação, Sebastião Sahão Junior também sabe que assume num momento delicado, que o obrigará a repensar a estrutura do CPqD como forma de enxugar custos até desnecessários, dados os indicadores de desempenho que apresentaram, no comparativo com outras instituições voltadas para a Inovação do setor de telecom no país.
Custo x benefício
Documento em poder do portal Convergência Digital, também mostra que a área comercial do CPqD está muito aquém do seu desempenho, se comparado o retorno financeiro que gera e a estrutura envolvida com este processo em relação à outras fundações. Para se ter uma ideia do tamanho do problema, o CPqD gasta por ano em torno de R$ 40 milhões, divididos em vendas, representantes comerciais, pré-venda, Marketing e participação em eventos do setor de Telecomunicações com possibilidade de retorno comercial.
Uma parte do problema estaria na gestão de contratos duvidosos, que tornam-se deficitários mas, assim mesmo, garantiram o pagamento de comissões de vendas de até 12%, mas em alguns casos chegaram a 18%. Nos documentos há uma denúncia, de que um representante comercial teria recebido, em dinheiro, uma comissão no valor de R$ 1 milhão. A denúncia ressalta que, mesmo com toda a crise financeira da fundação, o representante comercial foi contemplado com este pagamento.
Além disso, o CPqD contaria com aproximadamente 1.300 colaboradores, que teriam gerado receitas de R$ 600 milhões. Com muito menos colaboradores, o Instituto Eldorado (aproximadamente 650), gerou receitas da ordem de R$ 150 milhões. Para acrescentar um detalhe à discussão: Entre vendedores efetivos, o Instituto Eldorado contaria apenas com cinco profissionais enquanto que o CPqD teria 51.
O descompasso também se verifica na questão salarial. Enquanto o CPqD pagaria em média R$ 11,8 mil de salários aos colaboradores da área comercial, na área de pesquisa o salário médio ficaria em torno de R$ 7,5 mil. Uma diferença em torno de 33%, que pode chegar a 56% - quando pago o bônus por venda - entre o que ganha um vendedor e um pesquisador com mestrado ou doutorado, cuja formação acadêmica e experiência são reconhecidas no exterior. Talvez venha daí o fato de o "ISE - Indice de Satisfação dos Empregados" também tenha sido negativo nas metas apuradas pela fundação em 2014.
Fonte: Convergência Digital de 10 de junho de 2015. Matéria escrita por Luiz de Queiroz.

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