quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Contribuição das teles à Condecine é suspensa por liminar

O juiz Itagiba Catta Preta Neto, da 4ª Vara Federal da Justiça de Brasília, concedeu liminar ao SindiTelebrasil suspendendo o recolhimento da Condecine às empresas filiadas à entidade. Na interpretação do magistrado, "somente deve suportar o tributo quem for integrante do setor que demanda uma atuação efetiva no segmento sujeito à intervenção".
Para Catta Preta, ainda que se vislumbre uma tênue vinculação entre os setores em questão, "tal vinculação não se apresenta em caráter estrito e isto justifica o afastamento da norma instituidora do tributo, ao menos em princípio".  A decisão final somente virá com o julgamento da ação contra a Ancine.
A "Condecine das teles" foi reajustada em dezembro do ano passado em 28,5% e, segundo o SindiTelebrasil significaria uma despesa adicional de cerca de R$ 200 milhões para as operadoras este ano. O argumento das empresas é de que o índice aplicado está muito acima da inflação.
As empresas de telecomunicações recolhem a Condecine por determinação da Lei do SeAC (12.485/2011), que reduziu o Fistel (taxa de fiscalização das teles) e criou uma alíquota de Condecine proporcional à redução. Com isso, as teles são hoje as principais responsáveis pelo recolhimento da taxa.
De acordo com o Portal da Transparência, em 2014, as teles recolheram R$ 702,3 milhões para a Condecine, que fechou o ano com recursos da ordem de R$ 784,5 milhões. A Ancine vai recorrer da decisão.
Análise
A decisão da Justiça é um terremoto para o mercado audiovisual. Se for mantida a decisão, a Condecine (e portanto o Fundo Setorial do Audiovisual) perde a sua principal fonte arrecadadora, o que vem garantindo um orçamento de cerca de R$ 800 milhões ao ano para a agência do cinema e permitiu a disponibilização de cerca de R$ 550 milhões para o FSA (dados de 2014 referentes a valores disponibilizados, mas não necessariamente aplicados). As teles contribuem com a maior parte da Condecine (cerca de 90%).
Mas a decisão é mais grave do que parece. Além do tombo no orçamento da Ancine, essa perda de receita afeta substancialmente o modelo de financiamento da Ancine a produções audiovisuais brasileiras destinadas à TV paga (ainda que do total de recursos disponibilizados no FSA em 2014, apenas 30% estejam alocados em ações relacionados a produção e programação de TV).
Vale lembrar que a Lei do SeAC (12.485/2011) fez uma alteração na metodologia de recolhimento do Fistel (tributo recolhido pelas teles sobre o licenciamento de qualquer estação de telecomunicações, o que inclui cada aparelho de celular em operação em suas redes). Em lugar de recolherem toda a taxa do Fistel para o fundo de telecom, houve uma redução desse valor e a parte "abatida" passou a ser destinada para a Condecine. Para as empresas de telecomunicações, o valor total permaneceu o mesmo, mas o destino nos cofres públicos passou a ser diferente. O problema é que no final de 2015 o governo reajustou a parcela referente à Condecine em 28,5%, o que gerou uma despesa extra para as teles de R$ 200 milhões, quebrando o "equilíbrio" que havia desde a Lei do SeAC e implicando, na prática, um aumento da carga tributária do setor. Isso despertou o desejo das empresas de contestarem o pagamento da Condecine na Justiça. Alegam que o setor de telecomunicações está, por meio do Fistel, subsidiando um outro setor (o de produção audiovisual), sendo que as operadoras móveis, que pagam o grosso da taxa, pouco ou nada se beneficiam dessa produção.
Ainda não está claro se a ação do SindiTelebrasil será revertida se o reajuste da Condecine for revisto ou se a disposição das operadoras de telecomunicações é manter a disputa contra o pagamento da Condecine. As empresas, com exatamente o mesmo argumento, brigam na Justiça há anos contra a Contribuição para a Radiodifusão Pública (destinada a financiar a EBC – Empresa Brasil de Comunicação). A CRP utilizou a mesma estratégia da Condecine: abatimento do Fistel de um lado e um novo tributo proporcional do outro. Mas, nesse caso, sem a concordância das empresas de telecom, que foram à Justiça e ganharam o direito de recolher em juízo até o julgamento de mérito.
Quando a Lei do SeAC passou a destinar recursos do Fistel para o setor audiovisual, o argumento usado à época pelo Legislador foi o de que as empresas de telecom se beneficiariam diretamente, por serem operadoras de TV por assinatura, que receberiam mais conteúdos nacionais e mais baratos. Na prática, as operadoras de telecom só aceitaram tacitamente não disputar na Justiça a mudança nas regras do Fistel porque tinham interesse na aprovação da Lei do SeAC, que abria o mercado de TV paga por completo às empresas.
Durante o Seminário Políticas de (Tele)Comunicações, realizado nesta terça, 2, em Brasília, Oscar Petersen, diretor regulatório da América Móvil, sem citar a liminar, já havia criticado o fato de o governo conseguir usar os recursos do Fistel para uma aplicação específica, se referindo ao caso da Condecine. O setor de telecom critica o governo por não permitir que nada desses recursos dos fundos de telecomunicações (Fistel e Fust) sejam aplicados em programas de inclusão digital ou em políticas de universalização de serviços de telecomunicações, como seria o propósito original. A argumentação é sempre de que o tesouro precisa de recursos dos fundos para fazer caixa. "A Lei do SeAC destinou uma parte do Fistel para financiar o setor audiovisual e isso está sendo feito com sucesso, então não se pode dizer que é impossível. É preciso vontade apenas", disse Petersen, ao citar o uso dos recursos provenientes do setor de telecom para abastecer o Fundo Setorial do Audiovisual.

Fonte: Teletime News de 3 de fevereiro de 2016, por Lucia Berbert e Samuel Possebon.

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