A Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CREDN) realizou nesta quarta-feira, 27, uma audiência pública que discutiu os impactos da implantação da tecnologia 5G no Brasil. Três pontos nortearam os debates: a segurança tecnológica, especialmente dos dados dos usuários; a necessidade de agilidade na publicação do edital do leilão da faixa de espectro que acolherá a tecnologia no Brasil; e a interferência na recepção do sinal do serviço de televisão por parabólica (TVRO). Segundos os debatedores, esses aspectos, se não solucionados, podem tornar a implementação da tecnologia no Brasil um pouco mais lenta do que se espera.
Segurança
Segundo Tiago Machado, diretor de relações governamentais da Ericsson, uma das fornecedoras que atuarão da implementação das redes de 5G das operadoras, o aspecto da segurança envolve quatro eixos: equipamentos, padrões, redes, operação. "Essas quatro camadas devem ser olhadas de maneira conjugadas e devem trabalhar em sintonia", disse o representante da Ericsson.
Marina Pitta, Relações Institucionais do Coletivo Intervozes, destacou que o importante seria valorizar empresas que tivessem produção e tecnologia brasileira. "Não cabe a nós falarmos se esse ou aquele fornecedor possui confiabilidade nos equipamentos. Durante o vazamento de informações da NSA, por exemplo, foi noticiado que os funcionários da NSA instalaram backdoors nos roteadores da Cisco", disse a jornalista, para destacar que não importa o país da tecnologia e do equipamento que será usado na implementação do 5G no Brasil. Também lembrou que é preciso garantir investimentos em software e outros insumos que integram a cadeia produtiva tecnológica, porque só as fabricantes de equipamentos internacionais não garantirão empregos no país.
Atilio Rulli, diretor sênior em governo e relações públicas da Huawei do Brasil, disse que a empresa chinesa é 100% privada, sem nenhuma participação do governo chinês. "A Huawei está no Brasil há 21 anos. Temos parcerias com institutos de tecnologia, institutos de pesquisa, universidades e atendemos o setor público. Inclusive, fornecemos os equipamentos para a reunião do bloco dos BRICS, quer aconteceu recentemente aqui no Brasil", disse. Rulli também destacou que a empresa chinesa, uma das líderes do mercado mundial em fornecimento de equipamentos para a tecnologia 5G, trabalha com requisitos de segurança há 20 anos, e é a única que possui requisitos de segurança de ponta a ponta, da transmissão à recepção do sinal.
O edital do leilão da faixa de 5G no Brasil
Karla Crosara, superintendente executiva da Agência Nacional de Telecomunicações, lembrou que o edital ainda está em análise pelo conselho diretor da Agência. No começo deste mês de novembro, o conselheiro Emmanoel Campelo, que havia pedido vistas à proposta apresentada pelo relator Vicente Aquino, na reunião 17 de outubro passado, solicitou prorrogação do pedido por até mais 60 dias. A este noticiário, Campelo afirmou que poderá trazer a sua análise na última reunião do conselho, que será no dia 12 de dezembro, o que gera riscos de que uma definição sobre o edital só venha a ocorrer em 2020. O texto do edital ainda passará por uma consulta pública de no mínimo 60 dias, mas possivelmente mais, e será necessária uma análise de até 150 dias por parte do TCU.
Segundo Rafael Steinhauser, presidente da Qualcomm para a América Latina, o Brasil pode ser o primeiro país da América Latina a implementar a tecnologia 5G, mas que para isso, é preciso agilizar o processo de leilão da faixa de espectro o quanto antes. "O 5G permite conexões de alta confiabilidade. Se atrasarmos muito a implementar o 5G aqui no país, não teremos um modelo de indústria 4.0 (industrias com capacidade de produção diferente da linha de montagem tradicional). É vital aprovarmos a licitação do 5G. Depois da licitação, existem outros processos que precisam ser iniciados. E quanto mais atrasarmos a licitação, mais demorado entraremos na era da tecnologia 5G", disse o executivo.
Crosara também lembrou que o edital das faixas do 5G seguirá os compromissos e obrigações que foram colocados nos outros editais da telefonia móvel e será respeitado a neutralidade tecnológica. "Em todos os editais anteriores publicados pela agência, temos como premissa a neutralidade tecnológica. Isso permite que todos os fabricantes tenham capacidade de participar da implementação da tecnologia no país", disse a representante da Anatel.
O problema das TVRO
Outro aspecto abordado na audiência, e que precisa ainda ser resolvido, envolve o problema da interferência na recepção do sinal da televisão por parabólica (TVRO). Segundo Wender Souza, representante da Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abratel), este é um dos serviços mais antigos de radiodifusão que provém acesso ao sinal de televisão à população brasileira. "Hoje o Brasil possui 66 milhões de domicílios. Desses, 22 milhões contam com a parabólica. Isso representa 33% dos domicílios brasileiros que assistem televisão por essa tecnologia", apontou o engenheiro. Souza foi enfático ao dizer que as faixas destinadas ao leilão 5G interferem na prestação do sinal de TVRO. Ele citou o relatório da Anatel publicado em agosto, que deixa claro que não há solução ou equipamento que resolva o problema da interferência do 5G na TVRO. "Por isso, antes de pensar em leilão, é preciso dar uma solução para o TVRO. Pois precisamos garantir o acesso à população brasileira a este serviço, que hoje é seguro, e usado há mais de 30 anos", defendeu. Testes posteriores realizados pelas teles e pelo CPqD, contudo, apontaram que alguns filtros de nova geração podem mitigar completamente as interferências no 5G. Estes testes serão considerados pelo MCTIC e pela Anatel na definição das políticas e das condições do edital, respectivamente.
Como proposta, o representante da Abratel reiterou a solução de tirar toda a base receptora da TVRO da banda C e migra-la para a banda ku, com uma distribuição de kits para aqueles que acessam o serviço e possuem baixa renda. "Como boa parte dos usuários da TVRO tem poucos recursos, temos cerca de 50% que são população de baixa renda, queremos que a Anatel promova um trabalho de distribuição de kit's de recepção da banda KU para esse público". Segundo o executivo, essa migração custaria em torno de R$ 2,9 bilhões.
Os entraves do edital do leilão da faixa do 5G no Brasil
Além do calendário apertado que rodeia o trâmite do edital que organizará o leilão do 5G no Brasil, existe um outro problema que pode significar uma negociação sobre o texto final do edital: a entrada do leilão como parte do portfólio de projetos do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do governo federal. A decisão foi formalizada pelo Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos (CPPI), em reunião na última terça-feira, 19, em Brasília.
A este noticiário, Crosara disse que será necessário afinar alguns pontos com a Casa Civil, que é quem comanda o Programa de Parcerias de Investimento (PPI). A agência está, até o momento, andando normalmente com o processo de construção do edital. Os benefícios da qualificação do leilão de espectro 5G no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do governo federal ainda serão analisados pela Anatel nas próximas semanas, declarou na última quinta-feira, 21, o presidente da agência reguladora, Leonardo Euler, a este noticiário.
Como o PPI se coloca como uma política em que o governo federal busca parcerias estratégicas para determinados projetos estruturantes do país, a possibilidade de uma ingerência política no processo pode, em tese, acontecer. Questionada, Crosara disse que acha que tal possibilidade não existe, porque há elementos técnicos que comprovam que a neutralidade tecnológica, princípio adotado pela agência nos editais até aqui, tem-se mostrado eficaz. "Temos elementos técnicos que mostram que a postura adota pela agência é eficaz. E isso torna a ingerência política na escolha de qualquer parceiro estratégico algo distante de acontecer", afirmou.
Fonte: Teletime News de 27 de novembro de 2019, por Marcos Urupá.
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