A publicação da informação de que a Anatel estaria cogitando uma intervenção na Oi alimentou, de imediato, uma queda de mais de 8% nos papeis da operadora e gerou grandes constrangimentos dentro da agência. As informações publicadas pelo Estado de S. Paulo são parte de estudos que estão sendo feitos pela Anatel e eram tratados com total reserva dentro do órgão regulador. Este noticiário apurou que não há, no estudo, qualquer indicativo de que seja necessária uma intervenção, mas sim que esta é uma possibilidade dentro do cenário de degradação dos indicadores econômicos da empresa. Trata-se de um levantamento de cenários, e este é o pior cenário possível. Importante lembrar que em março o conselho diretor da agência determinou que o acompanhamento da empresa fosse intensificado. Este estudo nada mais é do que o relatório resultante da determinação.
O fato é que a Anatel está acompanhando os números da Oi desde 2014, e esse acompanhamento se intensificou após a recuperação judicial, em junho de 2016. Após a aprovação do plano de recuperação pelos credores, no final de 2017, a crise na operadora baixou de temperatura, mas tanto dentro da empresa quanto na Anatel sempre houve clareza de que a calmaria era passageira. A Oi precisa muito que algumas coisas aconteçam para poder sair totalmente da crise: a melhora do ambiente regulatório (entenda-se, PLC 79); a recuperação da economia; a alienação de ativos não estratégicos (imóveis, participações em operadoras africanas etc); e, principalmente, a entrada de um investidor. Nenhuma destas condições ainda se satisfez plenamente. O governo Temer entendeu tarde que a crise da Oi era, na verdade, uma crise do Estado, porque a responsabilidade dos serviços prestados é, em última instância, da União. O governo Bolsonaro parece ainda não ter se debruçado sobre isso, muito menos a nova legislatura do Congresso. E mesmo dentro do conselho da Anatel, pelo menos dois dos cinco integrantes atuais não viveram o que foi a agonia pré-recuperação judicial. Os resultados financeiros negativos da empresa, ainda que esperados, apenas mostram que existe uma tempestade no horizonte. A Oi tem um plano de investimentos anunciado, mas para executá-lo sem queimar o caixa, precisa que as condições esperadas desde a recuperação judicial comecem a se materializar.
Mas o que pode ser feito pela Anatel, além dos estudos de acompanhamento? Está claro que o PLC 79/2016 é cada vez mais incerto, e muita gente já aposta que ele não sairá sem mudanças, o que implica mais tempo de tramitação. Portanto, a Anatel precisa colocar o plano B na rua, e o único plano B possível é sinalizar ao mercado o que acontecerá com as concessões em geral (e com a concessionária especificamente) a partir de 2025. Com isso, será possível que a Oi destrave alguns dos movimentos, como a venda de ativos não estratégicos, e reduza as incertezas para ter um novo investidor. Um elemento chave é o tratamento a ser dado aos bens reversíveis e o que acontece com a concessão após 2025, quando termina o contrato atual (que não pode mais ser renovado, vale destacar). Sem isso, a Oi permanece no atoleiro da incerteza regulatória.
A Anatel analisa há alguns anos a revisão do Regulamento de Bens Reversíveis. Há inclusive uma proposta bastante inovadora: a de transformar o regulamento em um Regulamento da Continuidade da Concessão. Nesta nova abordagem, a agência não teria mais que calcular o valor dos bens reversíveis, nem dizer o que deve devolvido à União, o que seria uma conta complexa e certamente disputada até chegar na Justiça. Na nova abordagem, caberia ao futuro operador do STFC dizer o que efetivamente precisa para prestar o serviço em regime público, e a Anatel apenas arbitraria uma negociação entre a Oi e o futuro operador. Bens ainda não amortizados gerariam uma receita para a Oi, bens já amortizados seriam transferido para o novo concessionário.
A incerteza sobre este modelo é o que acontece se não houver mais ninguém interessado para prestar o serviço de STFC em regime público a partir de 2025. No limite, mantido o marco legal atual, caberá à União manter os serviços. A Anatel encaminhou ao Senado, recentemente, uma estimativa de quanto isso poderia custar e chegou ao número de R$ 43 bilhões, mas é um número bastante impreciso, pois considera as condições operacionais atuais, tanto em termos de custo quanto de receitas. Em 2025 o cenário certamente será outro, mas se a União tiver que manter o serviço de STFC em todo o Brasil terá que colocar isso no orçamento, e se preparar para ter condições operacionais de fazê-lo. É um tremendo abacaxi, de qualquer maneira.
O resumo da ópera é que, ainda que a intervenção na Oi não seja iminente, a operadora precisa ser objeto de atenção e ação por parte da Anatel e Executivo, pelo tamanho e relevância da Oi como concessionária de telefonia mas também pela sua relevância sistêmica, como provedora de backbone nacional e acesso banda larga em municípios onde não há competição. O cenário atual é apenas uma continuidade da crise que começou em 2014, que vem sendo acompanhada pela agência e que sem dúvida se deteriora com qualquer sensacionalismo sobre o problema. Mas o governo Bolsonaro precisa ter a noção exata da complexidade da situação.
Fonte: Teletime News de 16 de agosto de 2019, por Samuel Possebon.
Nenhum comentário:
Postar um comentário