sábado, 29 de julho de 2017

Procuradoria da Anatel diz que não cabe desconto por exclusão de canais abertos da TV paga

A Procuradoria Federal Especializada da Anatel (PFE), que analisa os aspectos jurídicos dos processos em tramitação na agência, entendeu que a retirada dos canais abertos da grade das operadoras de TV por assinatura não obriga as operadoras a concederem desconto aos assinantes. A manifestação da procuradoria (leia a íntegra aqui) se deu no âmbito de processo movido Instituto Nacional de Defesa do Consumidor (Inadec), que questionou a retirada dos canais SBT, Record e Rede TV das operadoras que atuam em São Paulo e Brasília. O instituto é ligado ao deputado Celso Russomano.
O entendimento da área jurídica da Anatel é que a retirada dos canais abertos configura uma alteração de plano de serviços, e por isso deve ser comunicada com antecedência ao assinante e dada a possibilidade de cancelamento, sem multa, do serviço. Mas a procuradoria entendeu que não cabe desconto porque os canais abertos eram distribuídos por força de uma obrigação legal, e não parte de canais pagos.
O entendimento da procuradoria é que com o fim da transmissão dos sinais analógicos de TV aberta, houve uma mudança de regime jurídico a que a relação entre emissoras de TV e operadoras de TV paga estavam vinculadas. Se enquanto as transmissões eram analógicas vigorava a obrigação de carregamento dos canais (must-carry), com o fim das transmissões analógicos passou a vigorar o regime de consentimento de retransmissão (retransmission consent). Em ambos os casos, contudo, a decisão do que fazer não decorre da vontade do operador de TV por assinatura, mas sim de uma obrigação legal ou da vontade do radiodifusor. Também não existe espaço para a interferência da Anatel nessa mediação, entende a procuradoria.
"De acordo com a Lei nº 12.485/2011, extinguiu-se, com o final das transmissões analógicas, o dever de observar o must carry, princípio segundo o qual a distribuição era uma obrigação da operadora de televisão por assinatura, passando-se ao regime jurídico do retransmission consent, no qual o detentor dos direitos sobre o canal de radiodifusão de sons e imagens deve autorizar a sua distribuição pela referida prestadora de serviços de telecomunicações", diz a análise da procuradoria, que explica ainda que "no presente caso, verifica-se que as radiodifusoras e as prestadoras de serviço de acesso condicionado não chegaram a um acordo. Ademais, além de as partes não terem chegado a um consenso e de as radiodifusoras não terem exigido a distribuição gratuitamente (…), elas não autorizaram tal transmissão e requereram expressamente a suspensão da distribuição dos canais SBT, Record e RedeTV (Simba Content) em tecnologia digital nas localidades de Brasília e São Paulo".
A leitura da procuradoria é, em essência, que as operadoras de TV por assinatura não tinham outra opção a não ser tirar o sinal.
Um dos pontos questionados pelo Inadec é que se havia a obrigação de avisar os assinantes com antecedência sobre a mudança de plano e dar a opção de cancelamento sem ônus (e a Anatel reconhece esta obrigação, tanto que instaurou processos para averiguar o descumprimento dessa obrigação), também deveria ser dada a opção de desconto proporcional. Para a procuradoria da Anatel, contudo, esse dispositivo da Resolução 488/2007, que no parágrafo 1 do artigo 28 prevê o desconto, só se aplica a canais fechados, pois a lei impõe, claramente, uma distinção entre canais obrigatórios e canais de livre provimento. Não faria sentido, diz a procuradoria, dar desconto caso um canal que era obrigatório tivesse seu carregamento interrompido, pois nesse caso haveria uma infração a uma determinação da lei e a punição seria outra. "Diante de todo o exposto, interpretando-se sistemática e teleologicamente a Lei do SeAC e a respectiva regulamentação, entende-se que o §1º do art. 28 da Resolução nº 488/2007 é aplicável apenas a canais fechados, razão pela qual o pedido constante da denúncia de possibilitar ao usuário exigir a concessão de desconto também não deve ser acolhido", diz o parecer.
A área jurídica da Anatel também não entende que haja infração ao Código de Defesa do Consumidor porque a situação enfrentada decorre de uma lei, que é específica e posterior ao CDC. A área técnica da Anatel também alega que não houve publicidade enganosa porque não havia nenhum impedimento de as operadoras fazerem propaganda incluindo os canais levados com obrigatoriedade.
Análise
O parecer da procuradoria jurídica da Anatel resolve a principal questão regulatória colocada no caso do corte dos sinais da Rede TV, SBT e Record: se caberia ou não desconto. Prevalecendo esse entendimento quando a decisão da agência for formalizada pelo Conselho Diretor da agência, as operadoras de TV paga deixam de ter uma pressão econômica para negociar com a Simba Content. Certamente as emissoras e o Inadec devem recorrer. Uma das possíveis argumentações é que havia, entre algumas dessas emissoras e as operadoras de TV paga, um contrato de distribuição dos sinais digitais em alta definição (HD) em vigor desde muito antes do desligamento do sinal analógico, e que por isso estes canais deveriam ser tratados como canais pagos. O único problema desse argumento será as emissoras justificarem a ordem unilateral para que as operadoras tirassem os sinais do ar sem que isso caracterize justamente uma quebra de contrato entre as partes.
De qualquer forma, as negociações entre Simba e operadoras de TV paga têm dados sinais de avanço e pelo menos uma operadora está bastante próxima de fechar os termos finais. Com isso, resolve-se a questão pela via comercial.

Fonte: Teletime News de 26 de julho de 2017, por Samuel Possebon.

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