Leonardo Euler de Morais, conselheiro da Anatel, esteve diretamente envolvido no processo de construção de uma solução para o caso da Oi no final de 2017. Todos os conselheiros da agência se envolveram bastante no processo, mas Euler é o relator de alguns dos processos críticos para a empresa, como a cautelar que impediu ações dos acionistas controladores sobre sobre o processo de recuperação (linha depois intensificado pela Justiça do Rio de Janeiro, que desobrigou o presidente da Oi, Eurico Teles, de submeter o plano ao conselho), e do processo de caducidade, ainda pendente.
Após a votação do conselho da Anatel no sentido de se posicionar contra o plano de recuperação na assembleia de credores, este noticiário conversou com diversos conselheiros da agência para posicionamento. As visões e informações prestados pelos conselheiros foram reproduzidas nas notícias que publicamos, respeitados os pedidos de resguardo da fonte quando foi o caso. Já Leonardo Euler optou por mandar um posicionamento escrito, que reproduzimos na íntegra, já que ainda não se conhece os votos e o posicionamento de cada conselheiro no processo em que a Anatel se opôs à RJ, mesmo sabendo-se que o resultado foi unânime. A seguir, os pontos enviados por Leonardo Euler de Morais a este noticiário:
"Primeiramente, importa 'separar os chapéus'. Como se sabe, a Anatel tem uma dúplice posição quanto às circunstâncias fático-jurídicas que permeiam a recuperação judicial em comento: além de credora de um percentual significativo da dívida da Empresa, tem como atribuição precípua a regulação do setor e, como órgão dotado de atribuições regulatórias, deve assegurar a continuidade da prestação do serviço público de telecomunicações.
No que tange ao papel de credora da Agência, prefiro abster-me de tecer maiores comentários, uma vez que essa discussão tem sido protagonizada pela AGU. Já na condição de regulador, eu entendo, por óbvio, como positiva a aprovação do Plano de Recuperação Judicial, porque:
* Por óbvio, o resultado da votação implica maior comprometimento (em especial, daqueles detentores de créditos concursais) com o soerguimento financeiro da empresa;
* Portanto, ainda que existam condições precedentes ao aporte de capital (os chamados commitment agreements que, vale dizer, não estão plenamente acordados entre as partes), os atores que votaram pela aprovação do PRJ se tornaram efetivamente partícipes da solução;
* Nessa linha, tais stakeholders não podem limitar a orientação de suas ações na direção de uma posição maximizadora em relação aos direitos que detêm;
* Ao contrário. Tais direitos estão atrelados, de mais a mais, à viabilização da companhia;
* O reforço deste comprometimento é importante para fazer avançar uma solução de mercado;
* A redução da litigiosidade é outro aspecto positivo a ser destacado;
* Em suma, foram vencidas etapas.
Etapas necessárias, porém, não suficientes. Em outros termos, a almejada solução de mercado avançou. Entretanto, está muito aquém de apresentar-se como definitiva.
* É preciso atrair, efetivamente, capital novo para o conjunto de empresas que integram o Grupo Oi.
* Repisa-se – pois, nesse caso específico, nunca é demais reiterar a razão quintessencial que permeia o processo – a viabilidade operacional de longo prazo e a sustentabilidade econômico-financeira das concessionárias do Grupo Oi constituem interesse público.
* Nessa perspectiva, aumentar o nível de investimento é fundamental, considerando o histórico subinvestimento aportado nessa importantíssima rede de telecomunicações, vital para a integralidade do sistema brasileiro de telecomunicações.
Reconhece-se que a atração de capital está atrelada à PREVISIBILIDADE, notadamente no que tange à forma do deslinde da RJ.
* Previsibilidade para que os necessários investimentos sejam adequadamente "precificados". Ou seja, o processo de incremento de capital novo não ocorre sem que haja ESTABILIDADE.
* Isso não implica, todavia, que o aumento de capital possa restar refém do arbítrio de posições eminentemente garantidoras por parte de quaisquer atores.
* No âmbito dessa discussão, é certo que tem peso importante os créditos públicos e a forma legal de seu endereçamento. Sem embargo, essa questão, repriso, extrapola a alçada do órgão regulador. A construção e/ou o anúncio de instrumentos legais cuja expedição não seja da alçada do regulador devem ser protagonizadas por outros atores.
* A mudança do marco legal das telecomunicações também conforma aspecto basilar.
* Para muito além da questão da Oi, essa matéria traz novas perspectivas no que concerne à dinamização do setor de telecomunicações ao deslocar investimentos da telefonia fixa para a banda larga, que deve estar efetivamente no centro da política pública.
*Entretanto, analogamente, esse é um tema que está em outra esfera, qual seja, o Congresso Nacional.
Fato é que, na ausência de uma solução de mercado definitiva, o desdobramento da Assembleia Geral de Credores limitar-se-á ao protelamento de situação periclitante: uma companhia ainda alavancada e sem os recursos necessários para soerguer-se financeiramente e reposicionar-se no mercado.
Enfim, conforme manifestação anterior, observou-se avanço. Porém, não significa cenário de "céu de brigadeiro".
Em razão disso, o processo administrativo do qual sou relator não teve, consoante meu entendimento, automático equacionamento.
As preocupações regulatórias permanecem, sem prejuízo da sedimentação de algumas conclusões, entre as quais:
* A proposta de abertura de processo para decretação de caducidade da concessão e cassação dos instrumentos de autorização, jamais representou alternativa apta a catalisar uma solução de mercado. Ao contrário, sua efetividade, ao menos até o atual contexto, catalisaria a derrocada da Oi.
* Nessa linha, foi prudente não antecipar medidas regulatórias que pudessem interferir, ainda que indiretamente, na evolução das tratativas em curso no bojo do processo de recuperação judicial (PRJ).
* Os elementos consignados na Nota à Imprensa por mim subscrita, ao solicitar a retirada do processo de pauta (ainda em 28/09), foram validados pelos fatos subsequentes.
Não estão, entretanto, eliminadas as possibilidades de fazer valer o dever-poder da Agência em lançar mão dos instrumentos que julgar necessários para garantir a continuidade da prestação do serviço.
* Nessa perspectiva, pugnar pela restrição de tais instrumentos legais no presente caso seria o mesmo que sustentar o impedimento do Poder Público assegurar a continuidade do serviço.
* Com efeito, vale lembrar que a situação de 'desequilíbrio econômico-financeiro decorrente de má administração que coloque em risco a continuidade dos serviços' é uma hipótese de intervenção expressamente prevista pela legislação (art. 110, inciso III, da LGT).
*Ademais, considerando que a concessionária está em recuperação judicial, o papel do órgão regulador fica ainda mais patente, devendo tomar, tempestivamente, as medidas necessárias e possíveis para salvaguardar o serviço e os inúmeros usuários que potencialmente possam ser atingidos.
Do exposto, por ora, recordando o popular jargão futebolístico, 'segue o jogo'."
Fonte: Teletime News de 8 de janeiro de 2018, por Samuel Possebon.
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