O Ministério da Economia faz, em seu comentário à consulta pública sobre a Notícia Regulatória da Ancine para a eventual regulação de canais lineares de vídeo no modelo OTT, o diagnóstico da inviabilidade do modelo legal brasileiro da TV por assinatura em relação aos novos modelos econômicos e tecnológicos. Para a Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade do Ministério da Economia (SEAE), não é adequado aplicar as regras atuais aos novos modelos de exploração do mercado audiovisual, como a distribuição de canais lineares diretamente ao assinante, pela Internet. Por outro lado, diz a secretaria, manter uma forte carga regulatória sobre os operadores tradicionais cria uma assimetria competitiva que coloca em risco a própria viabilidade das operações existentes. A íntegra da manifestação da SEAE pode ser obtida aqui. A consulta da Ancine vai até dia 25.
Nos comentários à consulta da Ancine, a SEAE se coloca favoravelmente, "no curto prazo, à remoção dos comandos presentes na legislação atual que não são consistentes com os novos paradigmas tecnológicos do ecossistema do audiovisual, bem como à redução do custo regulatório geral no setor do audiovisual e à simplificação do complexo sistema de regulamentação atualmente em vigor". Para a secretaria, é preciso modelar um ambiente regulatório que permita as melhores condições para o avanço da tecnologia e viabilize novos modelos de negócio e novos posicionamentos estratégicos.
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Mas o Ministério da Economia também afirma ser favorável, a médio e longo prazo, "a incentivar a necessidade de construção de regimes jurídicos estáveis em mercados de conteúdo online e off-line, cujas barreiras são cada vez mais nubladas pelo processo de convergência tecnológica". Ou seja, para a SEAE, é preciso desenvolver "uma verdadeira reformulação estrutural dos regimes regulatórios do conteúdo online e offline, para o desenvolvimento de estrutura legal coerente e neutra em plataforma que possibilitaria a criação de benefícios significativos para os consumidores e para os participantes do setor do audiovisual brasileiro".
A secretaria entende que "o marco regulatório do setor do audiovisual brasileiro precisa reduzir os custos regulatórios, pois ainda é amplamente baseado na existência de ilhas regulatórias e silos verticais, principalmente a da restrição à propriedade cruzada entre distribuidoras e produtoras/programadoras com sede no Brasil".
Ruptura e lei obsoleta
A visão do Ministério da economia sobre o mercado de TV paga parte de uma contextualização importante: "ao contrário do cenário estrutural que motivou a Lei do SeAC e, em particular, do modelo de grade de programação, as Over-The-Top (OTTs) de vídeo não possuem limitação de espaço, não precisando organizar o seu conteúdo de acordo com estratégias que observem os melhores marcadores na mediação de audiência. As OTTs de vídeo representam uma verdadeira ruptura com o modelo previsto pela Lei do SeAC, ao orientar o acesso ao conteúdo pela demanda e não mais pela oferta".
Para a SEAE, o consumidor de TV paga hoje é ativo, "escolhendo não apenas o produto, como também o momento de visualização, maximizando a sua utilidade no consumo de conteúdo audiovisual". No entendimento da secretaria, está havendo uma reorganização do mercado de TV, "com o público migrando de uma TV linear para uma não-linear".
Trata-se, diz a SEAE, de um ecossistema complexo, com o surgimento de modelos de negócios potencialmente disruptivos, como a desintermediação. "Assim, o processo de criação de valor não segue mais uma cadeia de valor linear, uma vez que a tecnologia digital permite muitas oportunidades para diminuir a dependência pelos fornecedores/compradores tradicionais". Ou seja, não é mais necessário um distribuidor do conteúdo. "Enquanto no passado os produtores e as emissoras dependiam muito das condições comerciais impostas pelos distribuidores tradicionais, eles agora podem usar a tecnologia e oferecer seu conteúdo diretamente ao público", lembra a análise. "Deve-se considerar que o setor hoje apresenta características distintas daquelas existentes à época da edição da Lei do SeaC", pondera. "Embora os benefícios destas transformações para os consumidores estejam bem estabelecidos, existe um impacto significativo nas operações dos provedores de serviços de telecomunicações, além de apresentarem uma série de desafios de natureza técnica, econômica, jurídica e, principalmente, regulatória diante do desenvolvimento e da introdução desses novos players OTT".
Conflitos e assimetrias
Para a SEAE, o fenômeno OTT tem gerado conflitos "diante de controvérsias acerca da igualdade de condições competitivas entre agentes econômicos submetidos a regimes regulatórios assimétricos". A resposta a esse dilema, no entendimento da secretaria do Ministério da economia, não é a aplicação da regulação legada ao segmento emergente, o que geraria "barreiras regulatórias artificiais limitadoras da convergência tecnológica".
Para a secretaria, se não houver proatividade na convergência de regimes regulatórios haverá favorecimento "de alguns players do mercado em relação a outros, vinculados a plataformas antigas, e pode condenar as plataformas mais antigas a uma diminuição crescente de seu público e a condições de concorrência insuportáveis". Além disso, para a SEAE, "a possível inviabilização de certos modelos de negócios pela diferença de regime regulatório envolve consequências que vão além da impossibilidade de competição entre as diferentes plataformas e à acentuação enviesada do efeito disruptivo promovido pelas OTTs, dizendo respeito também a qual é o modelo de política pública que se deseja imprimir ao setor audiovisual brasileiro face à nova realidade tecnológica última instância, pode diminuir até a oferta de opções de acesso ao conteúdo por parte do consumidor".
Por isso, para o Ministério da Economia, "na nova realidade de oferta crescente de meios para distribuição de produtos audiovisuais, as linhas regulatórias estabelecidas pela (Lei)12.485 devem ser repensadas em prol da convergência regulatória do setor. A legislação deve ser remodelada retirando-se dispositivos prejudiciais à concorrência e à inovação e não criando-se barreiras regulatórias que impeçam a expansão do efeito disruptivo causado pela distribuição de programação audiovisual via internet, seja linear ou VoD".
Fonte: Teletime News de 20 de maio de 2020, por Samuel Possebon.
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