A decisão do presidente Jair Bolsonaro de recriar o Ministério das Comunicações é positiva para interlocutores do setor de radiodifusão e do setor de telecomunicações, pois potencialmente devolve à pasta o prestígio perdido nas prioridades de políticas públicas com a extinção do Minicom no governo Temer, em 2016. Na ocasião, um ministério com longa tradição e temas específicos de radiodifusão e telecomunicações foi incorporado à Ciência, Tecnologia e Inovação, que tinha um orçamento quase seis vezes maior e nada menos do que 23 entidades vinculadas. Na prática, as pautas das comunicações foram diluídas em uma estrutura muito maior, perdendo prioridade na agenda do governo.
A avaliação geral é de que com a mudança de 2016, área de Comunicações perdeu relevância, ainda que houvesse um esforço de criar um ministério integrado, que de fato se dedicasse às Tecnologias de Inovações e Comunicações (TICs). Esse avanço aconteceu em dois momentos: na elaboração do Plano Nacional de Internet das Coisas e na publicação da Estratégia Brasileira de Transformação Digital, que foram duas ações integradas envolvendo telecomunicações e Inovação. Mas os resultados práticos foram poucos.
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Para a área de radiodifusão, o fim do Minicom em 2016 também representou a perda de protagonismo, ainda que na gestão Gilberto Kassab a área tenha recebido bastante atenção (o que já não acontecia no ministério de Marcos Pontes).
Mas a separação das Comunicações do MCTIC realizada agora por Jair Bolsonaro também trará complexidades. Primeiro, porque uma parte importante das políticas de inovação, inclusive ligadas aos temas de Internet das Coisas, ficam no MCTI, se afastando, pelo menos gerencialmente, das telecomunicações. Depois porque há processos complexos rodando e com longo histórico de tramitação no MCTIC, como a regulamentação de direitos de passagem e a elaboração do decreto que norteará a migração do modelo de telecomunicações, inclusive tratando da renovação de frequências. São políticas há muito esperadas e que podem ficar paradas agora até que a equipe do ministro Fábio Faria, incluindo o próprio, tome pé das coisas. A MP 980, que recria o Ministério das Comunicações, estabelece que a consultoria jurídica do MCTIC dará suporte ao Minicom, por exemplo.
Ineditismo, poder político e conflito
Mas é na parte de radiodifusão que acontece a mudança mais importante e potencialmente mais polêmica da recriação do Ministério e Comunicações. Pela primeira vez, o Minicom terá sob si a área de comunicação institucional do governo, tradicionalmente ligada ao Planalto, incluindo a relação com a imprensa, a gestão de verbas publicitárias e a transferência da EBC (estatal responsável pela TV Brasil), além da atribuição de gerir o "sistema brasileiro de televisão pública". Isso significa um ministério que terá, em uma ponta, a função de regular e outorgar empresas de radiodifusão e, de outra, a tarefa de manter o relacionamento comercial e editorial com veículos de comunicação. Além do fato de o ministro Fábio Faria ser genro do empresário Silvio santos, dono do SBT.
São áreas com imenso potencial de conflito de interesses, uma vez que o ministério passa a ter três instrumentos de pressão (outorga, regulação e verbas) sobre empresas com as quais se relaciona institucionalmente (imprensa). Esse excesso de poderes preocupa até mesmo empresas de comunicação que têm mantido boas relações com o governo Bolsonaro, segundo apurou o TELETIME.
É importante destacar ainda que a secretaria de radiodifusão é, tradicionalmente, um dos guichês do governo que mais intensamente se relaciona com o Congresso. É comum que a antessala do secretário de radiodifusão e do ministro da área sejam local de peregrinação de Deputados e Senadores pedindo a agilização de questões referentes a emissoras de rádio e TV regionais. Já a extinta Secom, agora incorporada à pasta das Comunicações, tem intenso relacionamento comercial e jornalístico com emissoras e veículos impressos nacionais e regionais. E a EBC, além da TV Brasil e da Agência Brasil, tem forte presença nacional pela rede de rádio.
Isso dá ao Minicom um papel chave de interlocução com o Congresso, tanto que a pasta teve entre seus ocupantes ao longo da história figuras de protagonismo político e lideranças partidárias, como Antônio Carlos Magalhães, Sérgio Motta, Pimenta da Veiga, Eunício Oliveira, Hélio Costa, Paulo Bernardo, Ricardo Berzoini e Gilberto Kassab.
Como deputado, Fábio Faria ainda não foi protagonista, mas vinha ocupando um luga cada vez mais importante no Congresso. Nunca foi próximo às pautas do setor de radiodifusão ou de telecomunicações, apesar de ter atuado por quatro anos da Comissão de Ciência, Tecnologia e Comunicações e ter relatado algumas matérias relacionadas. É visto como um parlamentar afável, mas direto no trato, como um político jovem mas que costuma deixar claras as suas opiniões, e com disposição para o diálogo, sem bandeiras específicas. Pelo menos no relato de interlocutores ouvidos por este noticiário.
Fonte: Teleletime News de 11 de junho de 2020, por Samuel Possebon.
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