A definição da Anatel sobre o enquadramento regulatório da oferta de canais lineares pela Internet ganhou um novo capítulo. O conselheiro relator da matéria, Vicente Aquino, decidiu abrir uma nova rodada de pedido de esclarecimentos às áreas técnicas da agência. Em memorando circular enviado pelo conselheiro a quatro superintendências da agência (Competição; Planejamento regulatório; Controle de Obrigações; e Fiscalização), o conselheiro faz uma série de indagações sobre o tema. A íntegra do memorando de Vicente Aquino está disponível aqui.
A Anatel está discutindo, desde o ano passado, se a oferta de canais lineares de TV pela Internet deve ser enquadrada como TV por assinatura (Serviço de Acesso Condicionado – SeAC, o que acarretaria uma série de obrigações legais, tributárias ou regulatórias) ou se devem ser considerados Serviços de Valor Adicionado, e portanto não sujeitos à regulamentação da agência. As áreas técnicas e jurídicas da Anatel e do próprio governo indicam o caminho do enquadramento como SVA.
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Não existem prazos para a resposta da área técnica da Anatel à diligência, mas, pelo teor dos questionamentos, o relator mostra-se preocupado sobretudo com as implicações econômicas e políticas da decisão que a Anatel tomará. Ele questiona desde como ficará o tratamento tributário até a obrigatoriedade de carregamento de canais obrigatórios. O memorando também cobra da área técnica respostas sobre a responsabilidade das eventuais falhas de mercado e falhas de governo e quais os ajustes legais necessários.
Apreensão
Segundo apurou este noticiário, a nova rodada de questionamentos feitos por Vicente Aquino criou grande preocupação junto aos setores que aguardavam uma decisão rápida sobre o tema. São grupos com grande interesse econômico, que vão desde os grupos de comunicação brasileiros até gigantes de mídia internacionais e empresas de Internet. Várias associações pedem a liberação da Anatel sobre os modelos prestados pela Internet, entre elas a Abert, TAP, MPAA e Câmara e-Net, que representam interesses de grupos como Globo, Warner Media, Disney, Amazon, Facebook, Apple, Google entre outros. Algumas destas empresas já manifestaram a dirigentes da agência preocupação com uma eventual demora na conclusão do processo. Empresas de telecomunicações como Telefônica, Oi e Sky também são favoráveis a um tratamento flexível dos modelos de oferta de canais pela Internet.
Os grupos de mídia, empresas de Internet e programadores internacionais já manifestaram para a Anatel algumas vezes que estão esperando uma decisão para realizar investimentos no Brasil. A Disney e a Warner Media, por exemplo, disseram que só trarão os serviços de streaming Disney Plus e o HBO Max ao Brasil quando houver certeza do ambiente regulatório para a oferta de conteúdos pela Internet. A Amazon também está segurando planos de expandir o Prime Vídeo no Brasil em função da incerteza regulatória.
Na outra frente, pedindo à Anatel prudência no tratamento regulatório dado aos modelos de Internet e reivindicando isonomia com o modelo tradicional de TV paga estão a Claro, a Associação Neo e os produtores independentes de TV. Eles pedem que os princípios da Lei do SeAC, que rege a TV por assinatura, ou sejam aplicados por isonomia às ofertas pela Internet, ou seja feita uma reforma ampla no marco legal, com uma flexibilização geral. Nesta última entrevista ao TELETIME, o VP de assuntos institucionais da Claro, Fábio Andrade, sugeriu que a Anatel aguardasse um posicionamento do Supremo e os debates no Congresso antes de tomar uma decisão. O Supremo está justamente analisando uma ação movida pelos produtores independentes sobre o tema. No Congresso, há pelo menos nove projetos de lei que reformam o marco legal da TV paga.
Questionamentos
Vicente Aquino determina às áreas técnicas que, primeiro, respondam aos questionamentos feitos pelas partes junto ao processo desde que o relatório foi concluído. Foram pelo menos sete manifestações. Depois, coloca uma lista de questionamentos feitos por Vicente Aquino à área técnica da Anatel são os seguintes:
As atividades de oferta de serviço de televisão linear por assinatura na Internet (TVLAI) e em redes dedicadas (SeAC) fazem parte do mesmo mercado relevante, ou serão mercados distintos? Em outras palavras, há substituição ou complementariedade entre os produtos ofertados? E na dimensão geográfica, há substituição ou complementariedade?
Existem falhas de mercado ou falhas de governo nesse mercado que criem uma dinâmica competitiva enviesada, ou seja, algum tipo de vantagem competitiva que não se justifique na eficiência dos agentes?
Caso seja identificada falha de mercado ou de governo, como migar ou neutralizar os efeitos dessa(s) falha(s)? Qual o remédio que deve ser aplicado para garantir um ambiente de justa concorrência?
Que instituição deve corrigir as eventuais falhas identificadas? Serão medidas regulatórias? Se sim, quais devem ser as medidas a serem tomadas no âmbito das competências da Anatel caso a TVLAI venha a ser enquadrada como Serviço de Valor Adicionado (SVA)? Se houver outras medidas que não competem à Anatel, a quem caberiam?
Como conjugar as eventuais medidas concorrenciais com os princípios constitucionais da comunicação social estampados no Capítulo V da Constituição Federal e que se aplicam a todos os meios de comunicação social independentemente da tecnologia, conforme preconiza o §3º do art. 222 da Carta Magna?
Caso todas as atuais prestadoras do SeAC deixem de usar redes dedicadas e migrem para a Internet, passando a ser enquadradas como SVA, quem distribuirá o conteúdo das TVs públicas, educavas e comerciais?
Qual a avaliação do impacto tributário de uma eventual migração das prestadoras atuais do SeAC para o modalidade SVA? Qual seria o impacto no nível estadual (ICMS), municipal (ISS) e federal (Condecine, CFPRP, Fistel, Fust, PIS/COFINS)?
Fonte: Teletime News de 1 de junho de 2020, por Samuel Possebon.
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