O anúncio de dois importantes contratos esta semana, com a Sky e com a Vero, representou para a FiBrasil um marco relevante: o início de projetos baseados na integração de sistemas e a sinalização de que outras empresas de peso (além da Vivo, acionista e principal cliente da FiBrasil) confiam no modelo.
São dois casos icônicos porque, no caso da Sky, é a entrada de uma operadora que até há dois anos so teria como opção para entrar no mercado de banda larga fixa a construção de uma rede própria. No caso da Vero, que já tem um acordo com a V.tal, o contrato com a FiBrasil representa uma sinalização de que faz sentido pensar em um modelo baseado em uma separação estrutural entre infraestrutura e serviço. Nesta entrevista, André Kriger, CEO da FiBrasil, e Alex Jucius, responsável pela área comercial da empresa, falam sobre a estratégia da empresa, o mercado e o significado das novas parcerias.
TELETIME – O que os dois anúncios de contratos desta semana significa para vocês? Como estas parcerias foram construídas?
André Kriger – É um trabalho estruturado que estamos fazendo desde o início da operação da empresa, em busca de "tenants" que buscam padrão de qualidade e desempenho (SLA) na rede. Também mostra que somos neutros de verdade, não apenas com o nosso âncora (Vivo) como um cliente importante, mas outros âncoras que se destacam, como a Sky que tem presença em todo o Brasil, e a Vero que tem experiência em rede neutra e escolheram a FiBrasil onde a gente está, até para ter comparações. É um mercado nascente e o importante é que a rede neutra seja completamente transparente, e melhor, do que a rede do ISP. Se der algum problema o cliente não vai ligar para a FiBrasil, por isso tem que ser sem problema.
Foi o primeiro contrato baseado no conceito de APIs abertas e padronizadas ou vocês tiveram que fazer algum ajuste específico para atender a estes clientes?
André Kriger – As nossas APIs fazem com que seja 100% transparente a relação com o cliente. No caso da Vivo, tivemos o desafio de desintegrar as redes originais, para poder permitir que outros clientes pudessem ser integrados, e reintegrar a Vivo em uma nova lógica de rede. No caso da Sky e da Vero são as duas primeiras parceiras nossas a entrar nesse regime de integração de API pleno. Para ter volume e escala tem que estar integrado profundamente nos nossos sistemas. Não tem como fazer, na mão, a venda, aprovisionamento, atendimento, cobrança… Por isso a questão da integração é muito crítica e por isso é importante que os usuários de redes neutras tenham APIs padronizadas entre todos os provedores de redes.
Os acordos mudam algo nas previsões de expansão da empresa?
André Kriger – Não, só reforçam o nosso planejamento inicial. Vamos chegar até o final de 2024 com 6 milhões de casas passadas, até o final deste ano um pouco além dos 5 milhões, passando de 200 cidades esse ano para 300 em 2024. Mas esses parceiros trazem um olhar diferente sobre os mercados em que a gente já atua. A Vivo tem uma visão sobre a cidade, a Vero terá outra e a Sky também tem outra visão, então conforme o mercado amadurece e o ecossistema amadurece, naturalmente vamos enxergar mais pontos de demanda de banda larga e buscar expansão. Dentro de determinado municipio, essa expansão da rede é analisada caso a caso, em função de projetos de urbanização, novos condomínios… É um processo natural de crescimento das cidades. A beleza é conseguir antecipar essas demandas .
CCMO da FiBrasil, Alex Jucius, durante painel no FOI 2022. Foto: Bruno do Amaral
Alex Jucius – A ideia é que seja um processo até preventivo: chegou num percentual de uso de uma CTO, a gente pode se antecipar à demanda, ampliar a capacidade e não ter quebra de vendas.
O acordo com a Vero tem algo a ver com a possível oferta de compra que tem circulado no mercado?
André Kriger – A gente não comenta sobre possíveis processos de aquisição, mas a parceria com a Vero não tem nenhuma relação com isso: o Fabiano (Fabiano Ferreira, CEO da Vero) foi meu par na Vivo e já nos conhecíamos há muito tempo. Ele foi uma das primeiras pessoas para quem eu liguei quando começamos a operação da FiBrasil. A gente já conversa há mais de um ano, antes mesmo deles anunciarem uma parceria com a V.tal. A gente ainda não tinha produto, sistema, nem processos, então o acordo precisou amadurecer, mas a conversa vem de muito tempo.
Nos eventuais processos de aquisição, o que vocês farão com os clientes das operadoras que forem adquiridas?
André Kriger – A gente não opera o cliente final, e não vamos concorrer com nossos clientes de rede. Quero sim ajudá-los a conectar o máximo de clientes. Quanto mais assinantes a operadora parceira faturar, mais a gente ganha também.
Vocês pensam em oferecer outros tipo de infraestrutura além da rede de banda larga, como cloud, CDN, plataformas de IPTV?
André Kriger – A gente não tem hoje outros modelos de oferta de infraestrutura, como cloud, CDN, mas sempre vamos olhar sempre que fizer sentido para o nosso cliente. Mas essa expansão de modelos não está no horizonte de curto prazo. A gente sempre ouve o cliente com duas orelhas: "qual o seu problema"? Ajudamos o operador com o que ele precisar, se não for conosco, indicando outros parceiros.
Alex Jucius – É comum o cliente ter quebra de vendas porque não tem estrutura para resolver um problema, e é natural que uma empresa focada em infraestrutura olhe para tudo. O importante é a separação funcional entre ClientCo e InfraCo, e permitir que exista uma máquina de vendas e uma máquina de entregas.
Para os clientes que não têm know-how de implantação de fibra, mas optem por fazer a instalação na casa do consumidor, vocês oferecem algum tipo de trienamento?
André Kriger – Quando o cliente faz a instalação do consumidor, a gente dá o suporte necessário, acompanha as equipes deles. A gente não dá capacitação nem treinamento, mas no start-up de qualquer operação a gente dá o suporte.
Recentemente a Oi e a Huawei anunciaram planos de utilizar a tecnologia de Fiber-to-the-Room. Vocês têm planos de fazer a mesma coisa?
André Kriger – A estratégia de FTTR é uma das estratégias para levar banda larga a todos os cômodos, mas existem outras soluções, com repetidor, mesh… Cada cliente tem uma estratégia, e a gente oferece o que eles quiserem.
Qual tem sido o maior desafio hoje de implementação das novas redes?
André Kriger – O principal gargalo na construção de redes de fibra é o licenciamento de postes. A gente fez contribuições nesse sentido na consulta da Anatel. Trata-se de um bem escasso, uma infraestrutura pública, e algumas empresas infelizmente acabaram ocupando espaço no poste sem o licenciamento adequado, sem pagar o aluguel do poste, o que criou uma assimetria e uma complexidade para a expansão de empresas sérias, como a FiBrasil.
Alex Jucius – A gente tem contribuído com a Anatel, e defendemos que as redes neutras sejam vistas como parte da solução desse problema, como forma de otimizar a ocupação dos postes. Nós nos propomos a isso, juntamente com uma ocupação regular, todos com as mesmas regras e fazendo o que é certo.
As dificuldades de importação de equipamentos e fibra têm afetado a expansão de vocês?
André Kriger – Cadeia de suprimento sempre foi um desafio para as operadoras de fibra, desde 2010. O que a gente fez foi antecipar compras, deixando equipamento em estoque e antecipando essa dificuldade na cadeia produtiva. Fizemos pedidos maiores do que a necessidade de curto prazo, e com isso garantimos o estoque.
As operadoras regionais olharam inicialmente com desconfiança para o modelo de redes neutras. Acha que essa percepção já mudou?
André Kriger – O mercado já está entendendo muito mais o modelo de redes neutras. No começo a gente via muito ceticismo, os acordos comerciais eram um noivado para os clientes entenderem o que poderia trazer aquele modelo. Mas ganhamos tração e conforme grandes players como Sky e Vero, que já está apostando em sua rede neutra, fecham o contrato, isso reforça o modelo. Se esses players que são enormes acham que é um bom negócio, isso muda a visão no mercado. Mas ainda há um processo de educação.
Alex Jucius – O take-up de usar ou não uma rede neutra é o mesmo. A diferença é que em uma rede própria você investiu e em uma rede neutra, não. O provedor consegue entrar uma cidade sem precisar colocar um caminhão de dinheiro na frente e pode investir em marketing e vendas. Na pior das hipóteses, ele consegue testar um mercado sem gastar quase nada.
Como enxerga o mercado de atacado e 5G?
André Kriger – Atacado não está no nosso foco. Existe uma possibilidade de usar a nossa rede para conectar antenas de 5G que estamos analisando onde pode fazer sentido, mas o mercado de 5G de small cells não deve trazer uma demanda no curto prazo para o nosso tipo de infraestrutura.
Alex Jucius – O nosso foco é vender tudo o que puder ser conectado pela porta da CTO.
O mercado de banda larga fixa tem mostrado uma dificuldade de retomar o ritmo de crescimento dos últimos anos. Acredita que o mercado tenha batido no teto?
André Kriger – O achatamento na curva de crescimento de banda larga, no meu entendimento, é um reflexo do boom que foi criado durante a pandemia, que antecipou a demanda. As pessoas estão voltando para o trabalho e com isso a demanda dá uma desacelerada. Mas é difícil dizer se o mercado bateu no teto, porque a previsão sempre está errada. Em 2006 eu fiz um business plan para WiMax e previa que a gente chegaria a 2015 com 10 milhões de acessos de banda larga no total, e deu 30 milhões, com nenhum WiMax. Acertei só um terço da previsão. O que existe é uma hiper competição no mercado, são cinco ou oito provedores em todas as cidades. De outro lado, as redes neutras abrem um espaço para novos players que não conhecem o mercado entrarem, como operadores virtuais de rede (FVNOs). São empresas que nunca operaram telecom e agora podem oferecer serviço de banda larga por uma rede neutra
Alex Jucius – Houve dois ou três anos de demanda antecipada. E agora, além do processo de consolidação, o que existe é uma profissionalização do mercado, com mais estrutura e capacidade de competição. Isso tem sido benéfico para o consumidor, porque a velocidade e a qualidade melhoram pelo mesmo preço. Agora começa a fase das redes neutras, em que vai ser possível uma expansão de baixo custo por meio de uma rede que já está instalada. No nosso caso, são 2,5 milhões de casas. Se o nosso cliente consegue 1% da rede, ele ganha 25 mil assinantes.
Fonte: Teletime News de 19 de agosto de 2022, por Samuel Possebon.
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