sexta-feira, 4 de outubro de 2019

Oi diz que operação móvel gera valor e concessão fixa é insustentável

A Oi enfrenta, neste momento, o desafio de dar impulso ao seu plano estratégico, com foco na ampliação de receitas e reconquista de mercado, e ao mesmo tempo enfrenta um cenário de fortes restrições a crédito em um momento em que os investimentos necessários para o 5G já começam a aparecer no horizonte. Nesta entrevista concedida por escrito, Eurico Teles, presidente da operadora, e Rodrigo Abreu, que acaba de assumir a função de COO, responsável pela operação da Oi, comentam alguns desses desafios.

Nesta entrevista, Teles fala dos planos da Oi para o edital de 5G, indica que a empresa considera a disputa no contexto de leilão não-arrecadatório e ressalta que o leilão está no radar da empresa. Sobre a a ampliação da atuação no mercado de fibra, Teles reforça que a Oi quer se tornar um "enabler" para provedores locais, inclusive players não-regulados. Ele também fala da interpretação do Tribunal de Contas da União sobre os bens reversíveis e reitera que a operadora discorda da leitura patrimonialista.

Já Rodrigo Abreu comenta sobre a eventual separação da operação móvel e sobre a importância desta operação na geração de valor da companhia, e destaca a prioridade que a empresa está dando ao plano de recuperação, inclusive no cenário de restrição de caixa.

Abreu confirma que o cenário da concessão de telefonia fixa, no momento, é de insustentabilidade, e que a operadora poderá optar, no limite, por rescindir o contrato de concessão e sinaliza que haverá discussões sobre "compensações devidas, incluindo indenizações de prejuízos decorrentes da insustentabilidade e do ressarcimento do investimento em bens reversíveis não amortizados".

Abreu também comentou a questão colocada pela Anatel em relação à oferta de serviços OTT. Para a empresa, as tornas se tornam obsoletas diante do cenário de inovação e não há como restringir os avanços. "A interpretação da legislação deve se adaptar às novas demandas (…), tomando o cuidado também de equalizar as condições de competitividade para todos os players", diz o executivo.

Vale lembrar que, conforme ata da reunião do conselho da operadora no último dia 20 de setembro, mas submetida à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no dia 30, foi confirmado que Rodrigo Abreu deverá assumir a liderança da empresa e a responsabilidade da implementação do Plano de Recuperação Judicial após o desligamento de Eurico Teles, embora a data ainda não tenha sido divulgada. Diz o documento: "O novo Diretor ficará responsável pela gestão operacional da Companhia de forma a garantir o direcionamento mais eficiente dos recursos para investimento, de modo a enfrentar os desafios que se projetam".

A seguir, a íntegra da entrevista:

TELETIME – Como a Oi pretende se capitalizar para a participação no leilão de 5G, considerando que a empresa já ficou de fora da licitação da faixa de 700 MHz e hoje é a operadora com o menor spectrum-share (além de ser a de menor market-share). É considerada a hipótese de consórcio ou parceria com outras operadoras (presentes ou não no mercado brasileiro)?

Eurico Teles – Faz parte do nosso plano estratégico a consideração de participação nos leilões de espectro da Anatel tanto para as sobras quanto para as novas frequências 5G, como parte de uma estratégia de geração de valor para a companhia. O plano prevê os mecanismos de geração/captação de caixa que nos permitiriam considerar a participação, e temos que lembrar que uma das discussões atualmente em curso é a de mudar o caráter arrecadatório das licitações para um que privilegia a possibilidade de investimentos produtivos por parte das empresas.

TELETIME – Considerando o rápido crescimento dos concorrentes locais (ISPs) no mercado de banda larga fixa, como estão os planos da Oi em relação ao modelo de revenda ou parcerias locais?

Eurico Teles – A Oi sem dúvida se destaca por sua imensa infraestrutura nacional de fibra ótica, e por sua vocação para atuação nacional, em um mercado que cada vez mais demandará capacidade tanto de transporte quanto de provimento local de serviços de alta velocidade. Nesse sentido, nosso plano prevê investimentos significativos em infraestrutura de fibra ótica, que sustentarão a nossa atuação tanto de maneira direta quanto, potencialmente, de maneira indireta, seja através de parcerias com provedores locais, seja atuando como provedora de infraestrutura no mercado de atacado. A Oi está se reposicionando no mercado de atacado (que inclui serviços de interconexão, transmissão de dados de alta capacidade, rede de acesso, dutos e serviços para provedores de internet), com o objetivo de ser o principal viabilizador (enabler) nacional de transporte de dados para os mais diversos tipos de clientes. Com sua ampla infraestrutura disponível, a Oi está bem posicionada para atender todas as necessidades do mercado não-regulado, atendendo a demanda crescente por dados, além de compartilhamento de infraestrutura com operadoras e provedores de Internet (ISPs).

TELETIME – Quais os resultados mensuráveis da estratégia de ampliação das redes de fibra, priorizada pela Oi nos últimos meses?

Eurico Teles – A Oi conta com vantagens competitivas para ampliar seu serviço FTTH (Fiber To The Home) por ter a maior rede de transporte de dados instalada do país, com mais de 360 mil quilômetros de fibra em todo o Brasil, e adota uma estratégia de reuso da infraestrutura que garante mais agilidade e redução de custos para implantação da Internet via fibra ótica até a casa do cliente. Com a aceleração dos nossos investimentos em fibra, ampliamos a nossa projeção de "casas passadas" ao final de 2019 para quase 5 milhões de casas, e temos acelerado significativamente o ritmo de nossas implantações e instalações. Hoje a oferta Oi Fibra já está disponível em mais de 70 cidades espalhadas pelo país, e estamos chegando a quase 500 mil clientes de banda larga em fibra ótica, um ritmo excelente e compatível com nossos planos agressivos de expansão dos serviços.

TELETIME – Recentemente o Tribunal de Contas da União trouxe um entendimento definitivo sobre a questão dos bens reversíveis que pode tornar as contas da Anatel desfavoráveis para as atuais concessionárias (por considerarem os valores patrimoniais e trazerem o indicativo de propriedade pública dos bens). Como a Oi pretende se posicionar?

Eurico Teles – É necessária uma discussão e análise muito cuidadosas da Anatel e do TCU com relação aos bens reversíveis, pois os mesmos precisam ser entendidos e analisados como o que são: um instrumento de garantia da continuidade dos serviços, e não um modelo patrimonialista. Na privatização, as empresas foram adquiridas, e os bens reversíveis definidos como uma maneira de garantir a continuidade de um serviço que naquele momento era essencial. Temos que lembrar que, passados muitos anos da concessão, hoje o modelo de atendimento é muito diferente, que foram realizados muitos investimentos ao longo do caminho, e que existem questões inclusive quanto à sustentabilidade da concessão, como temos já apresentado de maneira bastante diligente tanto para a Anatel quanto para o TCU.


Questões respondidas por Rodrigo Abreu

TELETIME – A Oi entende ser viável a separação da unidade móvel para uma eventual alienação, considerando que nos últimos anos uma das características da empresa foi uma forte integração de sistemas e core de rede para as operações fixas e móveis? Se sim, como seria feita esta segregação?

Rodrigo Abreu – Sem dúvida, ao longo do tempo a Oi, assim como todas as demais operadoras, buscou sempre trabalhar em modelos de infraestrutura que pudessem se beneficiar ao máximo de integração entre seus componentes de rede. No entanto, há que se reconhecer que, no nosso caso, a companhia tem uma imensa infraestrutura de transporte, backhaul e capilaridade que é bastante bem definida, e que serve como ativo de sustentação para os mais diversos tipos de serviços, e que por isso recebe uma atenção especial quanto à sua gestão e evolução, não tendo sido desenvolvidas de maneira indissociável de nossa infraestrutura móvel. Em relação a uma possível venda das operações móveis, é importante mencionar que temos hoje uma operação móvel sustentável, que gera caixa e tem apresentado ótimos resultados operacionais, em particular com nosso crescimento nos últimos 12 meses na aquisição de clientes pós-pagos, onde apresentamos desempenho bastante destacado. Dessa maneira, vale enfatizar que nossas operações móveis sem dúvida nenhuma têm um papel importante na geração de valor para a companhia, e que protegeremos essa capacidade para que possam ser tomadas as melhores decisões de evolução futura.

TELETIME – Ainda na hipótese de "fatiamento" da operação para a alienação da unidade móvel, como seria feita a separação da dívida? E como seriam feitos os ajustes de planos dos clientes convergentes (Oi Conta Total, por exemplo)?

Rodrigo Abreu – Não existe nenhuma discussão de "fatiamento" da companhia como chegou a ser aventado, de maneira superficial, e nosso grande foco é na execução de nosso plano estratégico de transformação, que como já mencionado traz prioridades de investimento bastante claras, e também define um caminho estratégico de crescimento que contempla várias possibilidades de geração de valor no longo prazo. A partir da execução desse plano, temos confiança no atingimento da sustentabilidade da Oi, com base em uma estratégia centrada nos investimentos em infraestrutura de fibra, que possibilitam um grande crescimento nas nossas operações de banda larga residencial, e que dão sustentação também para nossas atividades no mercado B2B, no atacado e na manutenção de nosso bom desempenho no mercado móvel, onde temos focado na reutilização de frequências e expansão da nossa capacidade em áreas prioritárias. Desse modo, ainda é prematuro considerar qualquer detalhamento de potenciais ajustes legais, operacionais ou comerciais, mas suficiente mencionar que existiriam possibilidades e opções viáveis como parte dos cenários possíveis de geração de valor futuro para a companhia.

TELETIME – Houve em 2019 uma aceleração do consumo do caixa da empresa em função de investimentos que a empresa tem feito, que ainda assim não superam os investimentos das demais concorrentes. Qual é o horizonte de manutenção deste nível de investimento considerando o nível de caixa atual?

Rodrigo Abreu – É importante lembrar que o plano de recuperação da companhia aprovado já previa a necessidade de um período de investimentos sustentado por uma injeção de recursos proveniente seja da venda de ativos seja de captações adicionais de recursos, e também que apresentamos ao mercado, recentemente, um plano estratégico de transformação bastante coerente, e com muita possibilidade de geração de valor no médio/longo prazo. O plano estratégico de transformação da Oi, divulgado ao mercado recentemente, traz prioridades operacionais bastante claras, e a companhia tem dado sequência à execução dessas prioridades. O centro da estratégia de investimentos é a aceleração dos projetos de fibra ótica, que possibilitam um grande crescimento nas nossas operações de banda larga residencial, e que dão sustentação também para nossas atividades no mercado B2B, no atacado e na manutenção de nosso bom desempenho no mercado móvel, onde temos focado na reutilização de frequências e expansão da nossa capacidade em áreas prioritárias. A partir do plano, anunciamos a aceleração do ritmo de construção de fibra em número de "casas passadas" ("homes passed"), e aumentamos a nossa previsão de construção para 2019, que agora é a de terminar o ano com quase 5 milhões de casas passadas, o que por sua vez tem gerado excelentes resultados em relação ao número de "casas conectadas" com contratação dos serviços de banda larga de alta velocidade. Com isso, não apenas mantivemos o plano de Capex desse ano, mas tivemos também uma pequena antecipação, e prevemos uma manutenção dos níveis previstos de investimentos para 2020, que deverá ser da ordem de R$ 7 bilhões. Como já dissemos algumas vezes, temos confiança na estratégia de vendas de ativos non-core e captação de recursos adicionais, além do foco na eficiência operacional, que podem garantir recursos suficientes para financiar nosso Capex como planejado. Cumpre lembrar ainda que o nosso plano de investimentos conta com o benefício significativo da existência de uma infraestrutura nacional de fibra, incluindo transporte, backhaul e capilaridade de acesso, que faz com que tenhamos custos menores de construção que nossos concorrentes.

TELETIME – Sabe-se que a concessão de STFC tornou-se insustentável no caso da Telefônica, o que é um indicativo de que o mesmo deve ter acontecido com a Oi. A operadora já sinalizou esta insustentabilidade para o governo? Se positivo, em que condições a operadora poderia optar por devolver a concessão?

Rodrigo Abreu – Sim, a Oi já apresentou o seu pedido de restabelecimento da sustentabilidade da concessão à Anatel há algum tempo, e o mesmo é amparado por dois pareceres. O primeiro é o estudo público realizado pelo grupo de trabalho do MCTIC e da própria Anatel em 2016 que atestou a insustentabilidade das concessões da Oi a partir de 2016. Soma-se a esse um estudo de 2019 realizado pela Consultoria Econômica Accenture, contratada pela companhia, que ratificou a conclusão pela insustentabilidade, trazendo métodos e dados atualizados. A Oi entende que é um direito da concessionária e um dever da Anatel o restabelecimento da sustentabilidade da concessão, utilizando-se para isso de medidas regulatórias que possam neutralizar as situações de insustentabilidade. Entendemos também que no limite, caso não restem alternativas, poderia ser discutida a rescisão contratual, com todas as compensações devidas, incluindo indenizações de prejuízos decorrentes da insustentabilidade e do ressarcimento do investimento em bens reversíveis não amortizados.

TELETIME – Considerando que recentemente a operadora lançou seu próprio serviço de TV no modelo OTT, como a Oi se posiciona em relação à oferta de serviços OTT lineares equivalentes aos serviços de SeAC tradicionais por empresas que não sejam operadoras de telecomunicações? A Oi entende que a legislação atual impede que canais ofereçam conteúdo diretamente ao consumidor, como defende a Claro?

Rodrigo Abreu – A evolução tecnológica do setor de telecomunicações nos coloca constantemente diante de novas alternativas de prestação de serviços. Esse é o caso. Existem diversos exemplos, também em outros setores, em que novas formas de prestação de serviço se sobrepõem, na prática, a regras que rapidamente se tornam obsoletas. A Oi entende que não há como restringir esses avanços e que, quando pertinente, a interpretação da legislação deve se adaptar às novas demandas decorrentes dessa evolução, tomando o cuidado também de equalizar as condições de competitividade para todos os players envolvidos. Dessa maneira, seguiremos com iniciativas inovadoras, com um ambiente regulatório ajustado e moderno e com maior diversidade de opções que possam estimular investimentos e ao mesmo tempo beneficiar os consumidores.

Fonte: Teletime News de 2 de outubro de 2019, por Samuel Possebon.

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